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Vigilantes dizem que morte de sertanista foi latrocinio

FSP, Brasil, p.A10
12 de Out de 2004

Versão de colega que estava com Apoena Meireles é confirmada
Vigilantes dizem que morte de sertanista foi latrocínio
José Eduardo Rondon
Da agencia Folha
A Polícia Civil de Rondônia ouviu ontem três vigilantes da agência bancária onde o sertanista e ex-presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio) José Apoena Soares de Meireles, 55, foi morto a tiros na noite de sábado.
Até o fechamento desta edição, uma fita de vídeo do sistema interno de segurança do banco, que pode identificar o autor dos disparos que mataram o sertanista, estava sendo periciada. A Polícia Federal acompanhava a perícia.
Apoena,que foi presidente da Funai em 1985 e 1986, foi morto com dois tiros durante uma tentativa de assalto em um caixa eletrônico no interior da agência, na região central de Porto Velho (RO).
"Os três funcionários que estavam na agência no momento do assalto confirmaram a versão da colega de Apoena [Cleonice Alves Mansur, funcionária da Funai, que estava com o ex-presidente da entidade quando ele foi morto]", disse o diretor-geral da Polícia Civil de Rondônia, Carlos Eduardo Ferreira.
Segundo Ferreira, os três vigilantes trabalhavam internamente na agência bancária, na sala de monitoramento das imagens do serviço interno do banco.
No depoimento de Cleonice, ao qual a Agência Folha teve acesso, ela relatou que um homem, aparentando 19 anos, que vestia uma calça jeans, camiseta preta ou azul, e um boné preto, rendeu o casal dentro do banco e anunciou o assalto. Apoena tentou se aproximar do assaltante, quando foi alvejado por um disparo. Após ser atingido, o sertanista, mesmo ferido, tentou ir em direção ao criminoso, que atirou mais uma vez.
Os três seguranças disseram ao depor terem visto os dois atracados pelo sistema de monitoramento. Após a ação, que teria sido rápida, eles avisaram a polícia.
A partir do depoimento da funcionária da Funai, a polícia elaborou um retrato falado do autor do crime, que foi distribuído em pontos movimentados da capital.
Nos anos 60, Apoena foi o primeiro branco a ter contato com os cintas-largas em Rondônia.
O enterro será hoje no cemitério do Caju, no Rio. O velório foi realizado ontem no auditório da Funai em Brasília e contou com a presença de seis índios xavantes da aldeia onde nasceu o sertanista, em Mato Grosso. Dois de seus três filhos foram ao velório.
"O perigo sempre esteve nas veias do meu pai desde que ele nasceu. Meu pai era um pacifista, acredito que até os inimigos respeitavam isso nele", disse sua filha Tainá, 28, que recusou o pedido de desculpas feito pelo presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, em nome da fundação. "Ele estava ali porque quis, sabia dos perigos iminentes por trás da profissão dele, estava ali para fazer uma coisa que ele gostava. Não tem por que pedir desculpas."
Apoena tentava obter porte de arma
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O sertanista José Apoena Soares de Meireles, assassinado a tiros na noite de sábado em Porto Velho, em Rondônia, tinha marcados para ontem exames em Brasília com o objetivo de obter porte de arma, disse o vice-presidente da Funai, Roberto Lustosa.
Funcionários da fundação que compareceram ontem ao velório do sertanista -que presidiu a Funai em 1985 e 1986- em Brasília disseram que Apoena relatara a amigos que estava sendo perseguido. Apesar disso, a Funai e o Ministério da Justiça disseram que as suspeitas maiores são de que o sertanista tenha sido vítima de latrocínio (roubo seguido de morte). Ele foi assassinado quando deixava o caixa eletrônico de uma agência do Banco do Brasil em Porto Velho.
O sertanista estava na região coordenando uma força-tarefa que tem como objetivo mediar conflito entre índios e garimpeiros na reserva Roosevelt, local da morte, por índios cintas-largas, de 29 garimpeiros em abril deste ano. "A princípio, os indícios apontam realmente para latrocínio, mas todas as hipóteses estão sendo investigadas", disse o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto. Segundo ele, a Polícia Federal está auxiliando a investigação da Polícia Civil de Rondônia.
O vice-presidente da Funai afirmou que a obtenção do porte de arma se justificaria pelo risco inerente à tarefa que Apoena desempenhava em Rondônia. "Nenhuma hipótese pode ser descartada tendo em vista os altos interesses em jogo na área", afirmou.
Acerto
O sertanista acertaria nesta semana com lideranças indígenas a retirada de máquinas (dragas e retroescavadeiras) do garimpo de diamantes da aldeia dos cintas-largas. A informação é do gerente do garimpo, Pandere Cinta-Larga, 30. O coordenador de Operações Especiais de Fronteiras da Polícia Federal, delegado Mauro Sposito, disse ontem que Apoena articulava com os índios uma nova ação, planejada em sigilo pelo governo federal, para fechamento definitivo do garimpo localizado dentro da terra indígena Roosevelt em Espigão do Oeste (534 km de Porto Velho).
"Nós estávamos de acordo em tirar todo o material do garimpo. Iam entrar com cinco ou seis caminhões para tirar tudo o que tinha lá dentro. Íamos fazer isso nesta semana", afirmou Pandere.
Após o confronto de abril, os cintas-largas firmaram, em maio, um acordo com a Polícia Federal para desativar o garimpo, mas um grupo de líderes indígenas teria retomado a extração de diamantes. Pandere nega.
Colaborou a Agência Folha em Manaus e em Campo Grande

FSP, 12/10/2004, p. A10

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