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No acordo entre Mercosul e UE, sobra para o Brasil a maçã envenenada

FSP - https://www1.folha.uol.com.br/colunas/
Autor: MENA, Fernanda
03 de Jul de 2019

País usa agrotóxicos proibidos pelo bloco europeu, e limites aqui são até milhares de vezes maiores do que lá

Fernanda Mena
3.jul.2019 às 2h00

Primeira vitória de Jair Bolsonaro (PSL), ainda que herdada de governos anteriores, o acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia (UE) extrapola a agenda ideológica do presidente ao mesmo tempo em que a restringe.

O acordo inclui termos de compromisso à proteção ambiental e ao desenvolvimento sustentável, dos quais não se sabe detalhes, mas que vão na contramão de dados recentes da atual administração federal.
Segundo o Instituto Nacional de Pesquisa Espacial, só em 2019 a Amazônia teve desmatada a área de uma cidade de São Paulo e meio.

Também neste ano, foram liberados no país 211 novos agrotóxicos, alguns dos quais contêm 17 substâncias de uso proibido pela UE.

Três dos dez agrotóxicos mais usados no Brasil (atrazina, acefato e paraquat) foram proibidos no bloco europeu há pelo menos 15 anos por serem neurotóxicas e carcinogênicas.

Ainda que a UE mantenha posições ambientais mais progressistas e parâmetros de uso de agrotóxicos mais restritivos, duas das dez maiores produtoras de pesticidas do mundo são europeias.

Seus produtos, alguns proibidos no próprio continente, são exportados para países como o Brasil, onde, ironicamente, tem uso autorizado em cultivos de café, milho ou soja, importados de volta pela Europa.

Se a proibição dessas substâncias nas plantações da UE evita a intoxicação por agrotóxicos -que no Brasil alcançaram quase 14 mil casos em 2017, segundo o Ministério da Saúde-, a restrição de resíduos nos alimentos protege os consumidores.

O limite de resíduo de glifosato, o agrotóxico mais usado no Brasil, permitido para o café que chega à mesa brasileira é dez vezes maior que o permitido na UE. No caso da soja, nosso limite é 200 vezes maior que o europeu. Já a água potável que o brasileiro bebe pode ter 5.000 vezes mais glifosato do que na Europa.

As comparações constam do atlas "Geografia do uso de agrotóxicos no Brasil e conexões com a União Europeia", de Larissa Mies Bombardi, do Laboratório de Geografia Agrária da USP. O Ministério da Agricultura afirma que as substâncias utilizadas no país têm eficácia e segurança comprovados.

O acordo entre Mercosul e UE ainda está longe de ser implementado, mas já dá para prever para quem vai sobrar a maçã envenenada.

Fernanda Mena
Jornalista, foi editora da Ilustrada. É mestre em sociologia e direitos humanos pela London School of Economics.

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