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Indígenas, quilombolas e ONGs ambientalistas criticam Lula por defesa de petróleo na margem equatorial

FSP - https://www1.folha.uol.com.br/
05 de Fev de 2025

Indígenas, quilombolas e ONGs ambientalistas criticam Lula por defesa de petróleo na margem equatorial
Presidente disse nesta quarta (5) que o Brasil precisa da exploração do combustível fóssil para fazer transição energética

Jorge Abreu

05/02/2025

A declaração do presidente Lula (PT) sobre a exploração de petróleo na Bacia Foz do Amazonas, na margem equatorial do país, em entrevista a rádios de Minas Gerais nesta quarta-feira (5), causou reações de organizações indígenas, quilombolas e ambientalistas.

Em nota conjunta, os grupos apontaram contradição na fala de Lula sobre o Brasil precisar do petróleo como solução para a transição energética. Segundo o comunicado, o posicionamento do governo não leva em consideração os riscos ambientais e climáticos, "perpetuando a exploração e a utilização dos combustíveis fósseis, a maior causa do aquecimento global."

Nesta manhã, Lula disse que "temos que utilizar o petróleo para fazer a nossa transição energética, que vai precisar de muito dinheiro". "Precisamos fazer um acordo e encontrar uma solução em que a gente dê garantia ao país, ao mundo e ao povo da margem equatorial que a gente não vai detonar nenhuma árvore, nada do rio Amazonas, nada do oceano Atlântico", ponderou.

Em nota, Toya Manchineri, coordenador-geral da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), destacou ameaças relacionadas à exploração de petróleo e também de potássio nas terras indígenas e seus entornos.

"Esses projetos não só ameaçam a vida dos povos originários, mas também causam danos ambientais irreversíveis, destruindo florestas, contaminando rios e comprometendo o futuro das próximas gerações. A luta pelos direitos indígenas e pela preservação da amazônia não pode ser minada por interesses que ignoram a vida e a dignidade dos povos originários."

A Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Negras Rurais Quilombolas) afirmou que a Petrobras estuda a região há, pelo menos, dois anos, mas não consultou os povos que vivem próximo ao local e que temem ser prejudicados pela exploração de petróleo.

"Exigimos que os órgãos e autoridades competentes realizem a consulta pública prevista na Lei no 9.784/1999 [de Processos Administrativos], pois a biodiversidade e as vidas humanas que ali vivem podem sofrer impactos irreversíveis", disse a Conaq.

Luene Karipuna, coordenadora-executiva da Apoianp (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amapá e Norte do Pará), lembrou que o bloco FZA-M-59 fica a 150 km de terras indígenas em Oiapoque, que concentra cerca de 80% da população indígena do Amapá.

Ela destacou que os territórios indígenas que já vêm sofrendo impactos sociais e ambientais que esse empreendimento traz para a região, em razão das aeronaves que passam por cima das aldeias e afugentam animais, além do maior fluxo de pessoas em Oiapoque.

"É contraditório apoiar o empreendimento que mais emite gases poluentes no mundo e acelera a crise climática após o Brasil ter apresentado na COP29 [conferência sobre mudanças climáticas realizada em 2024] a NDC que, pela primeira vez, cita a eliminação total do uso de combustíveis fósseis no país", disse.

"É contraditório também, nesse processo, não garantir o direito dos povos indígenas à consulta prévia e o diálogo direto; nos preocupa, pois a base que vai dar apoio a possíveis desastres desse projeto não está localizada e nem abrange o estado do Amapá", acrescentou Karipuna.

Atualmente, a Petrobras diz que irá construir um centro para atendimento de animais, em caso de vazamento de petróleo, em Oiapoque. A unidade é uma exigência do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para a aprovação da licença para pesquisa de óleo no chamado bloco 59. O projeto original da petroleira envolvia apenas atendimento em base em Belém, no Pará.

Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista-sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, avaliou que "não deveria haver emissão de qualquer licença ambiental no grito."

Segundo ela, o Ibama já emitiu mais de 2.000 licenças de perfuração offshore (dentro do oceano). A ativista destacou, ainda, que a região do bloco 59 é ambientalmente muito sensível e com correntes fortíssimas, o que colaboraria para espalhamento do óleo em caso de acidente.

"Os técnicos do Ibama têm apontado há anos os problemas associados a essas condições. Se o governo fizesse avaliações ambientais das áreas sedimentares, previstas desde 2012, a bacia da Foz do Amazonas já teria sido qualificada como inapta para a produção de petróleo", disse Araújo.

Rosana Santos, diretora-executiva do Instituto E+ Transição Energética, enfatizou que a possibilidade de o país iniciar novos ciclos de investimentos na produção de petróleo e gás vai na contramão das necessidades impostas pelo cenário climático.

Na visão de Santos, expandir uma infraestrutura de longa vida útil associada a uma alta taxa de emissão de carbono torna ainda mais difícil uma transição efetiva para fontes de energia menos poluentes.

"O protagonismo climático para o Brasil é, além de correto em termos de salvação do planeta, uma oportunidade de início de um novo ciclo de desenvolvimento, baseado na economia verde e na conquista de mercados demandantes por produtos de baixas emissões de gases de efeito estufa."

Ciro Brito, analista de políticas climáticas do ISA (Instituto Socioambiental), também apontou que a meta de explorar petróleo na Foz do Amazonas gera contradição e preocupação no ano em que o Acordo de Paris celebra uma década, e há a necessidade de abandonar combustíveis fósseis para cumprir metas climáticas.

Brito afirmou que o posicionamento do governo federal ignora o consenso científico e ameaça a credibilidade do Brasil como líder da COP30, que será realizada em novembro em Belém.

"A Foz do Amazonas abriga ecossistemas críticos, como manguezais, áreas úmidas e restingas, além de ser território de povos indígenas que dependem desses ecossistemas para sua sobrevivência e cultura. Ignorar esses alertas é um retrocesso inaceitável em um momento em que o país deveria dar exemplo de compromisso com a sustentabilidade", frisou o analista.

Também assinam a nota conjunta: WWF-Brasil, Iniciativa do Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, 350.org para a América Latina e Caribe, Amigos da Terra, Observatório do Marajó, Rede de Trabalho Amazônico, Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), Greenpeace Brasil, Centro Brasileiro de Justiça Climática e o Instituto ClimaInfo.

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