FSP, Brasil, p.A8
07 de Mar de 2005
Mapa com imagem de satélite foi usado para "lotear" cidade
Grileiros do Pará mapeiam áreas públicas para invasão
Silvio Navarro
Da agência Folha
À margem da calha norte do rio Amazonas, o município paraense de Monte Alegre (623 km a oeste de Belém) tem mais da metade de sua área dividida, sem autorização do poder público, por grupos de grileiros que planejam extrair madeira em tora e abrir caminho para o cultivo de soja.
A cidade paraense possui área de 21.703 km2. Desse total, cerca de 70% pertence ao Estado do Pará, e o restante, à União. No entanto, um mapa obtido pela Folha aponta que pelo menos metade dessas terras (uma área do tamanho da Jamaica ou do Qatar) já tem dono informalmente.
A divisão da área foi feita sob uma imagem de satélite, registrada por um aparelho GPS. A prática é comum entre madeireiros clandestinos e grileiros.
No quadro, a posse dos terrenos, é atribuída aos grupos da "Soja", do "Paraná", do "Mato Grosso", à "Empreendimentos Passarela", entre outros. Mas a Polícia Federal, a Prefeitura de Monte Alegre e os órgãos ambientais afirmam desconhecer a existência e o ramo de atividade desses grupos.
"É muito vago trabalhar com esses nomes. Por exemplo: Grupo Paraná é o pessoal que vem do Paraná, Grupo da Soja é o pessoal de Goiás e de Mato Grosso. Eles estão subindo, invadindo a parte do Pará para fazer plantio de soja", afirma o delegado da PF em Santarém, Mário Sérgio Nery.
No Estado de Mato Grosso, a expansão da soja valorizou a terra e empurrou a pecuária para dentro da floresta, agravando a devastação. "Até 2002, não havia conflito agrário aqui. Mas, com o advento da soja, a possibilidade do asfaltamento da BR-163 e de exportação pelo aeroporto de Santarém, começou a chegar muita gente", diz o prefeito de Monte Alegre, Jorge Braga (PTB).
A fotografia virou objeto de denúncia feita pelo prefeito ao Ministério Público Federal, à Polícia Federal, ao Ibama e ao Incra.
Uma cópia do mapa chegou às mãos do prefeito no ano passado, por meio de um amigo que se infiltrou entre os grileiros. A denúncia foi feita em novembro, mas, segundo a PF, só deverá ser levada a cabo agora, na esteira das operações deflagradas com a morte da freira Dorothy Stang, em Anapu.
Após entregar o mapa à PF e ao Ministério Público, o prefeito disse que está recebendo ameaças de morte. "Ao contrário de muitos prefeitos da região, que são parceiros desses caras -alguns viraram até sócios-, nós estamos reprimindo", disse.
Na semana passada, ele criou um fórum com diferentes segmentos da população local cujo objetivo é debater alternativas para combater a grilagem de terras.
Na ata de criação do fórum, Braga incluiu um item cobrando "que as polícias Federal e Civil dêem garantia de vida ao ex-prefeito Jardel Vasconcelos [PSDB], ao prefeito Jorge Braga e a outros que porventura venham a sofrer ameaças de morte por razões de disputas de terras".
Na reunião, os dirigentes do fórum nomearam uma comitiva de seis integrantes, encabeçada pelo próprio prefeito, que vai a Belém tentar um encontro com o governo estadual e com a PF.
"O que nós queremos é que o governo, o Iterpa [Instituto de Terras do Pará] e a polícia tirem esses grileiros daqui", diz o líder comunitário da região da PA-254 Gilmar Felício.
O texto também pede que o Ibama "faça parar imediatamente a estrada clandestina que os grileiros e madeireiros estão abrindo na região norte do município". Segundo o prefeito, a estrada, que já tem 38,3 km, está invadindo um assentamento do Incra.
O Ibama afirma que os mapas são similares aos capturados na região da BR-163, pólo madeireiro, e da Terra do Meio, alvo recente de desmatamento.
Conforme o mapa, o fracionamento da região avança sobre os municípios vizinhos de Alenquer e Almerim e invade reservas indígenas e assentamentos. Algumas fatias correspondem a serras com potencial para o corte de madeira.
FSP, 07/03/2005, p. A8
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