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Em nome da biodiversidade

FSP, Opinião, p. A3
Autor: DIMAS, Stavros
26 de Mar de 2006

Em nome da biodiversidade

STAVROS DIMAS

A conservação e o uso sustentável da diversidade biológica -a enorme variedade da vida na Terra- é essencial para o nosso desenvolvimento econômico e a qualidade de vida de cada um de nós. A maioria das coisas que usamos no dia-a-dia -o que comemos e bebemos, o material que usamos para construir as nossas casas ou os remédios de que precisamos para curar doenças- depende dela. Mas, hoje, o mundo está perdendo sua biodiversidade a uma velocidade alarmante porque os nossos padrões de desenvolvimento permanecem insustentáveis.
Além disso, a globalização está deixando as nossas economias nacionais e regionais cada vez mais interligadas. O que consumimos na Europa tem um efeito sobre a floresta amazônica, no Brasil. Precisamos, portanto, entender melhor essas ligações e garantir que o nosso desenvolvimento econômico e social conserve a biodiversidade, em vez de prejudicá-la.
O Brasil é o anfitrião da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica (CDB), que está acontecendo de 20 a 31 de março, em Curitiba (PR). A reunião internacional visa avançar rumo aos objetivos da convenção, ou seja, a conservação da biodiversidade, o uso sustentável de seus componentes e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios decorrentes do uso dos recursos genéticos. Por isso, a CDB é um evento importante não apenas para o futuro do meio ambiente da Terra mas também para o bem-estar futuro da humanidade.
A União Européia (UE), que, ao lado de 187 países, é parte da CDB, tem um compromisso forte para trabalhar ao mesmo tempo dentro das suas próprias fronteiras e em cooperação com países parceiros para estancar a perda da biodiversidade no mundo inteiro. Estamos levando muito a sério o objetivo, definido pelos líderes mundiais em Johanesburgo (África do Sul), em 2002, de reduzir substancialmente a taxa de perda de biodiversidade no mundo até 2010.
Na verdade, como contribuição a esse esforço global, a UE colocou a si mesma um objetivo ainda mais exigente: interromper o declínio da biodiversidade na União Européia até 2010.
O que é preciso conseguir em Curitiba? Primeiro, devemos avançar na criação de áreas protegidas. Esse é um dos principais instrumentos que temos para preservar a biodiversidade. O Brasil tem muito a mostrar ao mundo a esse respeito. Nós, europeus, tomamos conhecimento, com grande interesse, do tamanho da área da floresta amazônica recentemente colocada sob proteção pelo presidente Lula, bem como pela forma com que fontes alternativas de renda estão sendo geradas para financiar a conservação. Uma boa ilustração disso é o uso das taxas turísticas para manter o parque nacional em Fernando de Noronha, classificado como patrimônio mundial da humanidade.
A UE também é muito ativa no campo das áreas protegidas. Nossa rede européia de áreas protegidas terrestres e marinhas, chamada Natura 2000, é a maior rede desse tipo no mundo. Ela inclui 20 mil unidades e, quando estiver completa, cobrirá 18% do território dos nossos 25 países-membros.
A preocupação pela biodiversidade foi também incorporada dentro da política agrícola comum (PAC), e medidas para proteger o meio ambiente se tornaram uma parte integrante da política de desenvolvimento rural da UE. Hoje em dia, a PAC reformada é o maior instrumento financeiro para a gestão das áreas protegidas que pertencem à rede Natura 2000. E ela apóia também a agricultura orgânica.
Outra questão chave para o nosso encontro em Curitiba é o uso sustentável das florestas, dos oceanos e das terras agrícolas. O desmatamento ilegal e a conversão de terras devem ser combatidos, e o uso dos organismos geneticamente modificados, controlado, de forma a não colocar em perigo a saúde das pessoas ou o meio ambiente.
O conhecimento tradicional das comunidades locais e indígenas é um fantástico "banco" de conhecimentos sobre como o homem pode viver em harmonia com a natureza e usar seus recursos de forma sustentável, permitindo que as gerações futuras também se beneficiem deles. Esse conhecimento tradicional precisa ser preservado, e os benefícios induzidos pelo uso dos recursos precisam ser repartidos eqüitativamente com aqueles que o possuem.
Como já mencionei, a CDB é um instrumento essencial para o futuro da humanidade. Sendo assim, a UE tem apoiado países parceiros para ajudá-los a alcançar os objetivos da CDB. Por exemplo, temos financiado vários projetos no Brasil para a proteção da floresta amazônica e o apoio a comunidades indígenas e tradicionais para manterem ou melhorarem suas formas de vida.
Tenho a maior esperança de que a conferência de Curitiba realizará progressos significativos para a preservação da nossa biodiversidade.

Stavros Dimas, 64, formado em direito e economia pela Universidade de Atenas (Grécia) e mestre em direito pela Universidade de Nova York (EUA), é o comissário europeu para o Meio Ambiente. Na Grécia, foi ministro do Comércio (1980-81), da Agricultura (1989-90) e da Indústria, Energia e Tecnologia (1990-91).

FSP, 26/03/2006, Opinião, p. A3

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