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Desmonte do licenciamento ambiental compromete entrada do Brasil na OCDE

FSP, Tendências/Debates, p. A3
Autor: RAMOS, Adriana; NEIVA, Júlia
28 de Jun de 2021

Desmonte do licenciamento ambiental compromete entrada do Brasil na OCDE

Júlia Neiva
Coordenadora do programa de Defesa dos Direitos Socioambientais da Conectas Direitos Humanos

Adriana Ramos
Sócia do Instituto Socioambiental (ISA)

Aprovada recentemente na Câmara dos Deputados, a Lei Geral do Licenciamento Ambiental é hoje uma das mais graves ameaças à preservação do meio ambiente no país. Encaminhada ao Senado, a nova legislação, caso ratificada pela Casa, poderá colocar o Brasil passos atrás no caminho à entrada na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

O texto atual do projeto, que tramita no Congresso desde 2004, é um contrassenso às promessas que o país vem fazendo à comunidade internacional, como o Acordo de Paris, que determina a redução das emissões de gases do efeito estufa, e outros pactos sobre mudanças do clima, como a redução de carbono e a proteção das florestas e suas populações. A nova lei pretende flexibilizar o licenciamento e enfraquecer regulamentações que hoje asseguram a proteção ao meio ambiente.

Mais de 60 organizações da sociedade civil enviaram uma carta ao novo secretário-geral da OCDE, Mathias Cormann, alertando sobre os riscos de participação do Brasil no clube dos países ricos, durante o que chamaram de "um dos maiores ataques institucionais" às medidas de proteção ao meio ambiente, ao clima e aos povos tradicionais do país.

A adesão ao bloco é um processo político que se dá de forma paulatina. O Brasil já aderiu a alguns mecanismos, como o PCN Brasil (Ponto de Contato Nacional) para Diretrizes da OCDE para Empresas Multinacionais -um importante instrumento multilateral para prevenir e mitigar impactos econômicos, sociais e ambientais, resultantes das atividades de empresas multinacionais no país.

Como um dos cinco parceiros-chave do bloco no mundo, é fundamental que o Brasil demonstre seu compromisso no cumprimento de acordos internacionais e obrigações assumidas; afinal, a proteção ambiental é mais um valor agregado para a economia global do que um entrave, ao contrário do que argumentaram parlamentares ligados ao modelo agropecuário intensivista e sem visão de futuro.

Durante discurso na Cúpula do Clima, em abril, o presidente Jair Bolsonaro declarou ter duplicado recursos destinados à fiscalização e ao fortalecimento dos órgãos ambientais. Na prática, em dois anos de governo diminuiu a participação dos estados e da sociedade civil no Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), e extinguiu o Cofa (Comitê Orientador do Fundo Amazônia) e o CTFA (Comitê Técnico do Fundo Amazônia), entre outras medidas. No Ibama, suspendeu o sistema de multas ambientais e as operações de fiscalização e controle ao longo dos anos de 2019 e 2020.

O texto aprovado na Câmara sobre o licenciamento ambiental propõe ainda retirar a prerrogativa do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) de vetar empreendimentos que possam impactar unidades de conservação.

Com a flexibilização e o desmantelamento de regulamentações como o licenciamento ambiental, será inviável sustentar a narrativa de responsabilidade com o meio ambiente para parceiros comerciais cada vez mais preocupados com o impacto de seu consumo. Se o Brasil quer assegurar investimentos internacionais e fazer parte do comércio global, deverá garantir os mais altos padrões de preservação ambiental e de respeito aos direitos humanos.

FSP, 28/06/2021, Tendências/Debates, p. A3

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/06/desmonte-do-licenciamento…

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