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Brasil cobra ambição na COP, mas não faz 'lição de casa' climática

FSP, Ciência, p. B7
14 de Nov de 2017

Brasil cobra ambição na COP, mas não faz 'lição de casa' climática

ANA CAROLINA AMARAL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BONN (ALEMANHA)

Dono da maior floresta tropical do mundo, movido a hidrelétricas e ainda um país em desenvolvimento, o Brasil não tem inimigos nas negociações climáticas da ONU. Seu time de diplomatas é elogiado por todas as delegações pela atuação propositiva e conciliadora.
Da porta de casa para dentro, no entanto, a soma de decisões recentes do governo federal e projetos de lei que tramitam pelo Congresso resulta num saldo preocupante para a delegação brasileira na COP-23 do Clima, que abarca membros do Executivo, parlamentares, empresas e ONGs.
A percepção dos atores ouvidos pela reportagem é que o país, mais do que estar longe das suas metas climáticas, caminha na direção oposta a elas.
"Para cumprir sua meta climática, o Brasil precisa primeiro parar de retroceder no tempo", afirma Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, ONG que reúne 35 organizações ligadas a questões do clima.
Ele cita uma série de projetos que tramitam pelo Congresso com mensagem contrária ao Acordo de Paris, como a apelidada "Lei da Grilagem" (lei 13.465/2017), que anistia invasões de terras públicas feitas entre 2004 e 2011 e o projeto de lei do Jamanxim (PL 8107/17), que visa a entregar 350 mil hectares da Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará, a ocupantes que, em sua maioria, chegaram ao local após a criação da área protegida.
As decisões do governo também preocupam o grupo, como o corte pela metade no orçamento do Ministério do Meio Ambiente, que desde o ano passado depende do Fundo Amazônia para manter as fiscalizações do Ibama.

MP DO TRILHÃO
A mais recente delas pegou toda a delegação brasileira de surpresa: a MP 795, apelidada de MP do Trilhão, abre mão da arrecadação de impostos que podem chegar em R$ 1 trilhão até 2040 como incentivo a empresas interessadas na exploração de petróleo e gás a partir das reservas do pré-sal.
"A gente está andando na contramão da nossa história e da história das negociações climáticas", aponta Rittl.
Para além das contradições com as metas de redução de emissões de gases do efeito estufa, "a isenção às petrolíferas também não condiz com o maior apelo fiscal da história feito pelo governo com o teto dos gastos públicos", lembra o senador Jorge Viana (PT-AC). Para ele, neste momento "a maior ameaça às metas climáticas no país não é nenhum do setor da economia, é a política brasileira".
Nesta segunda, o ministro do Meio Ambiente Sarney Filho e um grupo de parlamentares que acompanha a COP decidiram em reunião trabalhar pela obstrução da MP 795 no Congresso. Como o projeto tramitou "às escondidas" por pelo menos dois meses entre Palácio do Governo e Câmara, o processo foi lento e deve expirar em 15 de dezembro.
O grupo de parlamentares na COP-23 conta com os feriados e a aproximação do recesso para que a MP não cumpra os prazos regimentais do Congresso.
METAS BRASILEIRAS
As metas enviadas pelo Brasil ao Acordo de Paris prometem reduzir as emissões de carbono em 37% (com relação a 2005) até 2025 e em 43% até 2030, com previsão de medidas em todos os setores da economia: do combate ao desmate ilegal, que deve ser zerado até 2030, até uma expansão de fontes renováveis como a solar e a eólica na matriz energética.
Marcelo Furtado, facilitador de um grupo de mais de 160 organizações -a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura-, aposta no potencial de medidas como o Cadastro Ambiental Rural, que mapeia os limites das propriedades e, assim, permitiria identificar desmatadores ilegais.
De acordo com ele, o cumprimento das metas climáticas brasileiras depende do fortalecimento dos marcos regulatórios. "O Brasil precisa mostrar que aqui se cumpre a lei; quem se esforça para estar dentro da lei não pode ser tratado igual ou pior do que quem trabalha na ilegalidade", aponta.
Da porta para fora, o negociador-chefe do Brasil na COP-23, embaixador Antônio Marcondes, exige que os países desenvolvidos cumpram seus compromissos com o Protocolo de Kyoto, estendido até 2020. E sopra da porta para dentro, em reunião da delegação brasileira, "apelo para que o Congresso também ratifique [a extensão do acordo], para que a gente possa avançar na ambição das metas climáticas".

FSP, 14/11/2017, Ciência, p. B7

http://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2017/11/1935212-contraditorio-bra…

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