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Aprovado sem debate, projeto de lei do Pará facilita grilagem, dizem entidades

FSP, Ambiente, p. A23
24 de Jun de 2019

Aprovado sem debate, projeto de lei do Pará facilita grilagem, dizem entidades
Apesar de pedido do Ministério Público, Helder Barbalho promete sancionar legislação em breve

Fabiano Maisonnave
Manaus
24.jun.2019

Aprovado a toque de caixa pela Assembleia Legislativa do Pará, o projeto de lei do governo Helder Barbalho (MDB) que altera o processo de regularização agrária em terras públicas estaduais abre a porta para a legalização de áreas griladas, segundo especialistas e movimentos sociais, que pedem a sua anulação.

"Em um estado com os problemas fundiários do Pará como violência e grilagem, conhecidos mundialmente, um projeto de lei como este deveria ser amplamente debatido. Infelizmente nem o Poder Executivo nem o Legislativo fizeram isso", afirma o professor da UFPA (Universidade Federal do Pará) Girolamo Treccani, especialista em direito agrário e ambiental.

Entre os pontos mais criticados do projeto, aprovado no último dia 11 e que agora só precisa da assinatura de Barbalho para entrar em vigor, está a mudança pela qual consideram legítimos ocupantes de áreas rurais pessoas físicas ou jurídicas "que pretendam exercer atividades agrárias em terras do estado".

"O que a lei atual prevê, no caso de pessoa física, é que tem de ter morada permanente, exercer atividade agrária e não ter outros imóveis", afirma a pesquisadora Brenda Brito, da ONG Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia). "Todos esses requisitos foram eliminados. No lugar deles, bastará, no caso de venda, que a pessoa esteja ocupando área pública e pretenda exercer atividade agrária posteriormente."

Outra modificação que enfrenta resistência é a inclusão de serviços ambientais como atividade agrária, o que abriria caminho para a venda de florestas para exploração madeireira -hoje, o modelo é permitido é de concessão.

Em carta assinada por 62 entidades, a avaliação é de que o projeto de lei "permite a privatização de florestas públicas", entre outras críticas. O documento, assinado pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), pelo Greenpeace e pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), entre outras organizações, pede o veto integral do PL 129/2019, para que seja substituído por uma nova proposta com a participação de representantes da sociedade civil.

Para o Treccani, apesar de pontos positivos, como o reconhecimento de projetos de assentamento e quilombos, o PL inclui também "graves retrocessos, como a tentativa de 'ressuscitar' os títulos de posse e provisórios".

"No caso dos títulos de posse, criados pelo decreto 410/1891, nem sequer se sabe quantos são, nas mãos de quem estão e onde ficam -e foram extintos em 1996 (decreto 1054). O PL visa revigorar documentos antigos que há mais de 20 anos deixaram de produzir efeitos", afirma o professor da UFPA.

Enviado pelo governo estadual à Assembleia em 5 de maio e votado em dois turnos 33 dias depois, o projeto de lei legisla sobre um território de 21,4 milhões de hectares de terras públicas estaduais sem definição fundiária. Trata-se de uma área pouco maior do que o estado do Paraná, segundo nota técnica do Imazon assinada por Brito.

Na segunda feira (17), os promotores agrários do Ministério Público Estadual enviaram um ofício a Barbalho pedindo que o PL seja debatido: "A consulta pública mais ampla vai possibilitar o aperfeiçoamento do projeto, a inclusão de temas relevantes para aumentar a eficiência e transparência da atuação do Instituto de Terras do Pará e evitar a apropriação indevida de terras públicas estaduais".

A Folha procurou na manhã de quinta-feira (20) um dos autores do PL, o presidente do Iterpa (Instituto de Terras do Pará), Bruno Kono, mas ele disse que não estava disponível. Um assessor de imprensa do governo do Pará procurou a reportagem à tarde e solicitou o envio de perguntas por escrito, mas tampouco houve resposta.

Em nota à imprensa distribuída na noite de quarta-feira (19), Barbalho disse que sancionará a lei em breve.

Em um trecho do texto, Kono diz que: "A lei cria as condições legais necessárias para que o agricultor familiar e o produtor rural tenham, de fato, e dentro da realidade de quem vive no e do campo, acesso à terra, e nela possam desenvolver suas atividades com segurança jurídica, acesso a crédito e à assistência técnica, e dessa forma tenham a oportunidade de melhoria da qualidade de vida e da sua família".

FSP, 24/06/2019, Ambiente, p. A23

https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2019/06/aprovado-sem-debate-proj…

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