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Programas sociais deixam 2,5 milhões de miseráveis de fora

FSP, Poder, p. A4
16 de Fev de 2013

Programas sociais deixam 2,5 milhões de miseráveis de fora
Meta de Dilma é localizar até o fim deste ano famílias que ainda não têm acesso a ações como o Bolsa Família
Desinformação e falta de estrutura em cidades mais pobres explicam falha no cadastro usado para pagar benefícios

João Carlos Magalhães

Apesar dos avanços na área, os programas sociais do governo federal ainda deixam de fora cerca de 2,5 milhões de pessoas que vivem abaixo da linha da miséria no país, de acordo com estimativa do Ministério do Desenvolvimento Social.
Encontrar essas pessoas, que hoje estão fora do Cadastro Único, base de dados usada para administrar os programas sociais, é essencial para a presidente Dilma Rousseff cumprir sua promessa de "erradicar" a extrema pobreza -o que só ocorrerá quando nenhum brasileiro ganhar menos que R$ 70 por mês, segundo o critério fixado pelo governo.
Se essas pessoas não entrarem no sistema, elas jamais serão incluídas em ações como o Bolsa Família, cujas transferências foram ampliadas por Dilma, e, assim, não serão resgatadas da extrema pobreza.
"Pretendemos fazer [o cadastro dessas famílias] até o final do ano. A presidente já nos indicou que o processo tem que ser acelerado", disse o secretário para Superação da Extrema Pobreza do ministério, Tiago Falcão.
Em junho de 2011, quando Dilma lançou o Brasil sem Miséria, plano com o qual espera cumprir sua promessa, cálculos feitos com dados preliminares do Censo de 2010 indicavam que existiam 800 mil famílias fora do cadastro.
O governo então mobilizou as prefeituras para localizar e incluir no sistema essas pessoas, em vez de simplesmente esperar que elas aparecessem espontaneamente para se cadastrar. Graças a essa iniciativa, 791 mil famílias foram encontradas.
Em abril do ano passado, o governo teve acesso a dados mais detalhados do Censo e concluiu que o problema era maior -aproximadamente 2 milhões de famílias miseráveis fora do Cadastro Único, ou seja, mais que o dobro das 800 mil identificadas anteriormente.
De acordo com as estimativas do ministério, ainda falta localizar 700 mil famílias que estão fora do cadastro do governo -ou cerca de 2,5 milhões de pessoas, considerando uma média de 3,6 pessoas por família.
O Cadastro Único reúne informações obtidas pelas prefeituras dos mais de 5,5 mil municípios do país, que são responsáveis pela localização dos pobres e pelo preenchimento dos formulários que alimentam o sistema do governo federal.
A dificuldade de cadastrar essas pessoas reside principalmente na falta de informação e no fato de elas estarem em lugares muito distantes de qualquer estrutura estatal -dezenas de lanchas passarão a ser usadas na busca por ribeirinhos miseráveis da região Norte do país.
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As falhas do cadastro foram citadas por Dilma no início do mês, quando a presidente disse que até março vai zerar o número dos extremamente pobres constantes no sistema -desde 2011, 19,5 milhões dos 22,1 milhões de miseráveis cadastrados passaram a ganhar ao menos R$ 71.
"Nós não podemos ficar satisfeitos com isso, não, só zerar o cadastro. Nós temos de ir atrás dos que faltam. Sabemos que tanto na cidade como na zona rural, no campo brasileiro, ainda tem famílias abaixo da linha da pobreza não cadastradas", afirmou a presidente.
O governo prepara novas medidas para zerar o número de miseráveis cadastrados e pode anunciá-las em evento na próxima terça-feira.

Apesar do inegável avanço, boa parte dos beneficiados corre risco de voltar à miséria

Gustavo Patu

"A tentação de superar a pobreza de maneira 'estatística' já se instalou na atual administração."
O texto, de agosto passado, foi escrito pelo analista chileno Ernesto Aguila, no jornal "La Tercera", a respeito do governo do centro-direitista Sebastián Piñera.
Como Dilma Rousseff, Piñera promete erradicar a extrema pobreza até 2014. Como a petista, criou no ano passado um programa focado nesse estrato social -o Brasil Carinhoso de lá se chama Ingreso Ético Familiar.
Nos dois casos, o governo paga às famílias valores suficientes para a superação da linha da miséria. A diferença é que a linha chilena é algo como o dobro da brasileira.
"Trata-se simplesmente de conseguir que, no dia e no mês da aplicação de uma pesquisa, a maior quantidade de pessoas se encontre, ainda que ligeiramente, acima da linha de extrema pobreza", como escreveu Aguila.
Com a reputação de produzir as estatísticas mais sólidas do continente, o Chile foi acusado, em outro episódio, de manipular dados divulgados em 2012 sobre a pobreza.
Os casos mostram que a indiscutível melhora dos indicadores sociais em praticamente toda a América Latina se tornou trunfo eleitoral.
Estudos concluem que os governos têm, sim, méritos no processo, ao elevar os gastos direcionados à população mais carente. A politização do tema, porém, leva tanto ao exagero do peso dos programas sociais quanto ao superfaturamento dos resultados.
A maior parte do progresso social acelerado a partir da década passada, segundo os estudos, está relacionada à expansão do ensino e a transformações no mercado de trabalho, feitos creditados a múltiplas administrações.
E, como apontou o Banco Mundial, a ascensão ainda é precária: 38% dos brasileiros e latino-americanos foram classificados como "vulneráveis", ou seja, sob risco considerável de voltar à pobreza.
O mesmo raciocínio vale para boa parte dos milhões de ex-miseráveis das estatísticas mais recentes.

FSP, 16/02/2013, Poder, p. A4

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/94083-programas-sociais-deixam-2…

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/94085-apesar-do-inegavel-avanco-…

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