VOLTAR

Marina critica termelétricas, Angra 3 e colega de governo

FSP, Brasil, p. A4
27 de Abr de 2007

Marina critica termelétricas, Angra 3 e colega de governo
Ministra afirma que não admite desenvolvimento sem conservação ambiental
No Chile, o presidente Lula afirmou que não existem barreiras "ambientais" ao crescimento econômico do Brasil, mas entraves "legais"

Marta Salomon
Da sucursal de Brasília

José Alberto Bombig
Enviado especial ao Chile

A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) criticou ontem, em audiência na Câmara, a construção de usinas térmicas como alternativa às hidrelétricas do rio Madeira, caso não obtenham licença ambiental.
Ela reiterou que o Meio Ambiente é contra a construção da usina nuclear de Angra 3 e disse que as termelétricas a carvão "estão na contramão do que está sendo feito no mundo".
De acordo com o Ministério de Minas e Energia, essas seriam as opções para substituir a geração estimada em 6.450 MW de energia nas usinas de Santo Antonio e Jirau, em Rondônia, e evitar crise no abastecimento a partir de 2013.
À noite, em entrevista no Palácio do Planalto, Marina repetiu o raciocínio e citou o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau: "Há uma preocupação em geração de energia, o que é correto da parte do ministro, o que não significa que ele não tenha que se preocupar com as questões ambientais igualmente importantes".
De acordo com estudos do Ministério de Minas e Energia, as alternativas às usinas do Madeira poderão aumentar a emissão de gás carbônico na atmosfera de pouco mais de 100 milhões de toneladas para pouco menos de 200 milhões de toneladas em 2016. Marina disse que não há prazo para o Ibama decidir sobre o licenciamento de usinas do Madeira.
"Está se criando uma idéia de que o país está paralisado por causa da questão ambiental", criticou a ministra. Segundo ela, as exigências aumentaram e o processo de licenciamento demora quando os estudos são falhos. Citou o exemplo da hidrelétrica de San Salvador (divisa doe GO e TO), que teria obtido licença ambiental no prazo recorde de seis meses.
"Para mim, é um falso dilema. Não se pode admitir que pessoas advoguem o desenvolvimento sem que se promova a conservação ambiental", disse.
No Chile, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que não existem barreiras "ambientais" ao crescimento econômico do Brasil, mas sim entraves "legais".
Lula assinou oito acordos de cooperação com a presidente Michelle Bachelet, alguns na área energética.
"O problema da construção de hidrelétricas não é ambiental, é legal. A política do meio ambiente é regulada por um conjunto de leis do Congresso que dá aos homens e mulheres obrigados a fazer a fiscalização os aparatos legais para agirem como agem", disse.
O cerimonial da Presidência não respondeu à solicitação da Folha para falar com o ministro Silas Rondeau, que integrava a comitiva de Lula. O presidente afirmou ainda que pretende flexibilizar a legislação por meio de um pacote de mudanças enviado ao Congresso junto com o PAC [Plano de Aceleração do Crescimento], sem medidas açodadas.
"É melhor demorar um pouco mais e fazer as coisas bem feitas do que fazer um monumento à insanidade como foi feito em Balbina na década de 80", disse Lula, em referência à hidrelétrica, no Amazonas, que causou grande impacto ambiental e tem baixa produtividade. "O mundo hoje exige de nós preocupações ambientais (...) Não significa que você vai deixar de fazer uma obra."
Durante a audiência na Câmara, Marina sugeriu como fontes alternativas de energia a biomassa (produzida a partir da queima de resíduos agrícolas ou outro material orgânico), a energia eólica, a energia solar e os biocombustíveis. No caso dos biocombustíveis, defendeu o aumento da produção sem aumento do desmatamento.
Questionada se ficaria ao lado de técnicos do Ibama ou cederia à pressão do governo, disse: "Não temos de culpar o aparelho de ressonância magnética porque descobriu que estamos com um tumor maligno".

País não precisa de nova usina, diz professor

Eduardo Geraque
Da reportagem local

O Brasil não tem necessidade de construir mais hidrelétricas para atingir a meta do PAC de aumentar a oferta de energia elétrica em 12.300 megawatts até 2010. A afirmação é do engenheiro Célio Bermann, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP e autor de um dos capítulos do "Dossiê Energia", lançado ontem pelo Instituto de Estudos Avançados da USP.
"Efetivamente não precisa construir uma nova usina", disse o pesquisador: "O Brasil tem hoje aproximadamente 70 usinas com mais de 20 anos que poderiam sofrer uma repotenciação [troca das turbinas]", explica.
Se isso fosse feito, mais ou menos 60% da meta do Programa de Aceleração do Crescimento já seria contemplada: "O custo é bem menor comparado à construção de novas usinas, que absorvem 60% dos investimentos somente em obras civis", lembra.
Os 40% restantes da meta do PAC poderiam ser obtidos sem nenhuma nova obra civil: "O próprio governo assume que as perdas do setor elétrico nacional hoje, desde a transmissão até chegar ao domicílio ou ao eventual consumidor industrial, são da ordem de 15%."
Para Bermann, se houvesse um esforço para que o desperdício fosse reduzido para 10%, isso já seria suficiente para fechar a conta: "Esses 5% de ganho, que não é muito, permitem atingir a meta do PAC. O sistema brasileiro todo hoje tem 97 mil megawatts aproximadamente".
Os processos de repotenciação renderiam quase 8.000 megawatts, e a redução do desperdício, mais 4.850 megawatts. Mas "isso tem de ser bem planejado, porque implica desligar as usinas para que as máquinas mais potentes possam ser instaladas".
Segundo Bermann, esse processo de repotenciação não ocorreu até hoje no país por causa da cultura das megaobras: "Parece que o governo prefere construir grandes usinas, porque elas acabam dando mais visibilidade", diz.
No debate, alguns especialistas defenderam que se vá devagar com o andor da infra-estrutura. "Se eu tiver que escolher algum lado em toda essa discussão, escolho por ela. Eu defendo a ministra Marina Silva", disse Luiz Pinguelli Rosa, da UFRJ, ex-presidente da Eletrobrás.
Apesar disso, Pinguelli defendeu o investimento em hidrelétricas. "O Brasil tem o maior potencial hidrelétrico do mundo, que deve ser considerado. Apenas 25% dele é usado hoje, enquanto os Estados Unidos usam 80%."

FSP, 27/04/2007, Brasil, p. A4

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.