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Fonteles pede ao STF inquérito sobre Jucá

FSP, Brasil, p. A7
13 de Mai de 2005

Fonteles pede ao STF inquérito sobre Jucá
Procurador-geral conclui que ministro era responsável pela Frangonorte quando empréstimo foi concedido

Rubens Valente

O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, pediu ontem a abertura de inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal), a ser conduzido pela Polícia Federal, para investigar o ministro Romero Jucá (Previdência Social) por supostas irregularidades no empréstimo concedido à empresa Frangonorte, de Roraima.
A empresa pertenceu a Jucá entre 1994 e 1997. O Basa (Banco da Amazônia) cobra do ministro Jucá e de seu ex-sócio Getúlio Cruz uma dívida de R$ 25 milhões do FNO (Fundo Constitucional do Norte). O dinheiro provém de recursos públicos. O valor cobrado foi atualizado pelo banco no último mês de março.
Procurado ontem pela Folha, o ministro não foi localizado para falar sobre o assunto. Ele passou a tarde em Manaus (AM). Segundo a assessoria do ministério, em Brasília, Jucá teria um compromisso oficial às 15h, na Prefeitura de Manaus, e em seguida iria cumprir "agenda pessoal". O advogado de Jucá, Antonio Carlos de Almeida Castro, disse esperar que o Supremo não acolha o pedido de abertura de inquérito feito pelo procurador-geral da República (leia texto ao lado).
Diligências
Além da abertura de uma investigação criminal (havia, até ontem, somente procedimento administrativo interno na Procuradoria), Fonteles pediu a realização de seis diligências, incluindo obter cópias da representação do procurador junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) Marinus Eduardo Marsico e de um relatório da CGU (Controladoria Geral da União) sobre o assunto.
No início desta semana, Marsico apontou Jucá, em representação no tribunal, como beneficiário "de ação criminosa e fraudulenta" -a apresentação, como garantia, de sete fazendas inexistentes no Amazonas, em agosto de 1996. Só depois dessas garantias é que o Basa aceitou liberar a segunda parte do empréstimo, de R$ 1,5 milhão ao todo.
A apresentação das falsas garantias foi revelada pela Folha no último dia 28 de março. Em seu parecer, Fonteles passou ao largo da questão. O procedimento foi originado para apurar outros aspectos do empréstimo, como a destinação do dinheiro. O advogado de Jucá disse considerar a questão das fazendas inexistentes um assunto "superado", já que o procurador "não pediu explicações", declarou Almeida Castro.
Mas o procurador, no decorrer do possível inquérito, também poderá estender a investigação para esse ponto. Sinal disso foi a requisição da decisão do procurador junto ao Tribunal de Contas da União. O parecer do procurador-geral, de 14 páginas, levanta suspeitas e traz algumas conclusões. Destaca-se o seguinte:
1 - Fonteles concluiu que o empresário Luiz Carlos Fernandes de Oliveira era apenas "mero empregado" de Romero Jucá. Isso pode comprometer toda a defesa do ministro no tocante às fazendas, estruturada na tese de que Oliveira, "um novo sócio", foi o responsável pela apresentação das propriedades fictícias e outros atos posteriores à saída do ministro da Previdência do negócio.
Fonteles examinou uma cláusula do contrato pelo qual o ministro da Previdência transferiu cotas suas da empresa para Oliveira. O procurador-geral sustenta que Oliveira exerceria na empresa apenas cargo de gerente, uma vez que ele estava proibido de "assinar aval, carta de crédito, carta de fianças e hipotecas, pela empresa ou pela pessoa física, fazer empréstimos com recursos da empresa, nem mesmo para o sócio, sob qualquer hipótese".
Dono
"Na verdade, Romero Jucá Filho e Getúlio Cruz permaneciam na administração central da empresa, porque a cláusula terceira dessa alteração foi textual em colocar Luiz Carlos como mero gerente", escreveu o procurador-geral. O contrato é de 27 de agosto de 1996 - 15 dias depois da apresentação das fazendas. A conclusão implícita é que Jucá era o responsável pela Frangonorte na época.
2 - Fonteles obteve e transcreveu trechos de um relatório de fiscalização do Basa que mostrou o abandono do empreendimento mesmo após a liberação da primeira parcela do financiamento, de R$ 750 mil, no dia 22 de dezembro de 1995. O procurador pediu que a PF tome os depoimentos dos gerentes do Basa à época da operação para que expliquem por que desconsideraram alerta escrito do funcionário do banco que fiscalizou a empresa, Antônio de Carvalho Nunes.
Ao final do seu relatório, Nunes recomendou "não liberar recursos enquanto permanecem as irregularidades". Mesmo com essa advertência, o Basa desembolsou mais R$ 750 mil em agosto de 1996 (tendo como garantia as sete fazendas fantasmas).
Entre os pontos a serem inquiridos dos gerentes do Basa, Fonteles destaca a necessidade de esclarecer as seguintes dúvidas: "Por que nova vistoria não foi feita, e quem autorizou a liberação de mais R$ 750 mil poucos meses após ter o fiscal Antônio de Carvalho Nunes expressamente consignado, em laudo, que a situação técnica do plano era anormal, que a situação administrativa da empresa era insatisfatória, que não havia, em local visível, placa alusiva ao financiamento e que o conceito do cliente era insatisfatório, o pior nas opções de avaliação".

Ação contra prefeita cita ministro
Eduardo de Oliveira
O ministro da Previdência, Romero Jucá, teve seu nome envolvido numa ação civil pública em que o Ministério Público de Roraima acusa sua mulher de participar de um esquema para desvio de dinheiro do erário municipal.
Em decisão publicada na terça-feira em Roraima, o juiz César Henrique Alves decretou a indisponibilidade dos bens e o bloqueio das contas bancárias da prefeita de Boa Vista, Teresa Jucá (PPS). A mulher do ministro é acusada de improbidade administrativa por ter ordenado o pagamento de R$ 4,9 milhões por serviços de coleta de lixo que não teriam sido realizados pela empresa que havia sido contratada.
Segundo a denúncia do Ministério Público, a microempresa F. Paulo Lucena Cabral, vencedora de uma licitação em 2001, recebeu o valor para serviços de limpeza em 18 bairros de Boa Vista. O Ministério Público sustenta que, apesar disso, a executora dos trabalhos foi a própria prefeitura.
Como provas, os promotores anexaram à ação fotografias de veículos da prefeitura que, segundo eles, eram utilizados para limpeza dentro da área de concessão.
Além da prefeita, o dono da empresa, Francisco Paulo Lucena Cabral, e os servidores Alberto Elionai Rodrigues Leitão e Arthur Machado Filho também tiveram seus bens e contas bloqueados.
Na ação, assinada pelos promotores Luiz Antônio Araújo de Souza e João Xavier Paixão, Romero Jucá é citado em trecho em que se levanta suspeita sobre a licitação. É relatada uma reunião que teria ocorrido em 2001 na qual Jucá teria discutido o loteamento de Boa Vista em três setores para serviços de limpeza e a destinação deles a quatro empresários, um deles Cabral.
A assessoria do ministro informou que ele "afirma categoricamente" que essa reunião não ocorreu. A reportagem não localizou ontem a prefeita Teresa Jucá. Anteontem, ela divulgou nota na qual reclamava não ter sido ouvida nenhuma vez e prometia esclarecer os fatos na Justiça. A reportagem procurou o empresário Cabral, mas ele não atendeu as ligações. Os dois funcionários públicos citados não foram localizados.

Outro lado
Advogado espera que o processo fique em Roraima
O advogado do ministro Romero Jucá (Previdência Social), Antonio Carlos de Almeida Castro, disse ontem esperar que o STF (Supremo Tribunal Federal) não acolha o pedido do procurador-geral da República, Claudio Fonteles, para abertura de um inquérito no STF.
Para Castro, o parecer de Fonteles refere-se a dúvidas "que não dizem respeito diretamente ao ministro", mas, sim, segundo a tese do advogado, "a pessoas que não têm foro privilegiado". Assim, para Castro, o processo, se aberto, poderia tramitar na Justiça Federal de primeira instância, na comarca de Roraima.
Castro discordou da análise que o procurador-geral fez do contrato pelo qual Jucá repassou suas cotas ao empresário cearense Luiz Carlos Fernandes de Oliveira (apontado pelo procurador-geral como "mero empregado" do ministro da Previdência Social).
"Ali é uma leitura bastante enviesada do contrato, porque qualquer [advogado] civilista, ao ler aquelas cláusulas, vai ver que a sociedade é administrada pelo Getúlio, e tem um parágrafo único que [diz que] na excepcionalidade outro poderia fazer esses atos", disse o advogado, que classificou a cláusula como parte de "uma análise partilhada da administração".
Castro não comentou o relatório do fiscal do Basa Antônio de Carvalho Nunes, referido no parecer de Fonteles, que apontou completo abandono do projeto mesmo após a liberação de R$ 750 mil: "[Nem] Sequer o doutor Fonteles diz que houve malversação ou mau uso do dinheiro. Agora, porque o projeto não deu certo, isso eu não posso responder, porque administrativamente, pelo projeto, eu não tenho responsabilidade, minha questão é puramente legal".
O advogado preferiu não comentar a representação do Ministério Público junto ao TCU que apontou, por parte de Jucá, fraude na apresentação de sete fazendas fantasmas no Amazonas para a obtenção de R$ 750 mil do Basa. "Não conheço a representação", disse.

As suspeitas sobre o ministro da Previdência e como ele se defende
TV Caburaí e Fundação Roraima
Acusações:
TV Caburaí - Relatório confidencial da Receita Federal aponta que Romero Jucá desviou verbas públicas para um negócio privado, a TV Caburaí, retransmissora da Rede Bandeirantes. A TV Caburaí pertence à Fundação Roraima, que deu o direito à empresa Uyrapuru -pertencente aos filhos de Jucá- de explorar a emissora
Fundação Roraima - Relatório da Receita Federal diz que, em 1994, na primeira campanha de Jucá ao Senado, dinheiro público destinado à Fundação Roraima foi desviado pelo hoje ministro. 0 TCU excluiu, depois, o nome de Jucá do caso
Defesa: Em nota, o ministro diz que "o sinal e a concessão do Canal 8 pertencem à Fundação Roraima, da qual não sou dirigente nem membro. A produção e a veiculação de matérias acontecem mediante acordo comercial por uma produtora de vídeo (Uyrapuru), pertencente a meus filhos, o que não configura crime ou outra atividade de cunho ilegal"
Prefeitura de Boa Vista
Acusação: Segundo investigação do Ministério Público em Roraima, funcionários contratados para trabalhar na Prefeitura de Boa Vista, sob a gestão de Maria Teresa, mulher do ministro, atuaram como cabos eleitorais de Jucá em 2002
Defesa: 0 ministro nega e diz que "a contratação se deu por licitação pública" e que a empresa contratada "presta serviços a diversos Estados e cidades brasileiras, além de atuar internacionalmente"
Compra de votos
Acusação: Em outubro de 2002, o Ministério Público Federal denunciou Romero Jucá por suposto abuso de poder econômico, com indícios de compra de votos nas eleições daquele ano. 0 hoje ministro da Previdência pode ter seu mandato de senador cassado caso seja condenado
Defesa: O ministro nega a acusação

Entenda o caso frangonorte
Recursos públicos
Entre dezembro de 1995 e agosto de 1996, o ministro da Previdência, Romero Jucá, obteve R$ 1,5 milhão em recursos do FNO (Fundo Constitucional do Norte) por meio da Frangonorte, sua empresa na época, um abatedouro de frangos de Boa Vista (RR)
Fazendas fantasmas
Em 28 de março deste ano, a Folha revelou que Romero Jucá apresentou ao Basa (Banco da Amazônia) sete fazendas inexistentes no Amazonas como garantias na época da liberação da segunda parcela do empréstimo da Frangonorte, de R$ 750 mil
Culpa do sócio e do banco.
Para se defender, o ministro disse que a responsabilidade sobre as fazendas era de seu ex-sócio, Luiz Carlos Fernandes de Oliveira, suposto proprietário das áreas rurais, e que o Basa era responsável por não ter conferido a existência das fazendas. Mesma alegação foi enviada à Procuradoria Geral da República
"Beneficiário de fraude"
A partir das reportagens da Folha, o Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) abriu uma apuração sobre o assunto. Na última segunda-feira, o procurador Marinus Marsico representou contra Jucá, acusando-o de ser "beneficiário de ação criminosa e fraudulenta"
"Indícios graves"
A Controladoria Geral da União detectou, em meio a uma fiscalização de rotina na sede do Basa, em Belém, a existência de "indícios graves" de irregularidades na liberação dos recursos para a empresa do ministro da Previdência
Pedido de inquérito
O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, pediu ontem ao STF (Supremo
Tribunal Federal) a abertura de um inquérito da Polícia Federal para investigar o financiamento para a empresa do ministro, além de diligências que têm prazo de 60 dias para sarem realizadas
Próximos passos
Por meio de distribuição automática, um ministro do STF assumirá a tarefa de relatar o pedido de Fonteles. Caso acolha o pedido, abrirá o inquérito e remeterá à Polícia Federal o pedido de diligências
Os resultados serão informados ao procurador-geral que, então, deverá decidir se apresentará denúncia formal, pedirá arquivamento ou solicitará novas apurações

Outros casos
Funai
Presidente da Funai entre 1986 e 1988, Jucá e dirigentes da fundação foram denunciados em inquérito movido pelo Ministério Público Federal sob a acusação de terem usado o órgão para comercializar ilegalmente madeiras de terras indígenas. Como Jucá exercia mandato no Senado, o inquérito foi para o STF, onde foi arquivado
Campanha de 1994
0 hoje ministro da Previdência foi acusado de abuso de poder econômico em 1994, durante sua campanha ao Senado. A Procuradoria Eleitoral entrou com pedido de cassação no Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, que chegou a cassá-lo, decisão revista posteriormente

Inquérito deve apurar suspeita de crime fiscal cometido por empresa de deputado
Jader é alvo em nova investigação
O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, pediu ontem ao STF (Supremo Tribunal Federal) a abertura de novo inquérito criminal contra o deputado Jader Barbalho (PMDB-PA), desta vez para apurar crimes fiscais que superariam R$ 1,5 milhão por parte da RBA (Rede Brasil Amazônia de Televisão), da qual é sócio.
Fonteles afirma que a Delegacia da Receita Federal em Belém enviou relatório ao Ministério Público Federal de uma ação fiscal na empresa, que identificou irregularidades. No pedido ao STF, ele não especifica o tipo do crime que teria sido praticado.
O processo administrativo contra a emissora de TV está em curso no 1o Conselho de Contribuintes. Se quitar o débito fiscal, Jader não poderá ser acusado de prática de crime neste caso.
Fonteles pediu a abertura do inquérito antes da conclusão do processo da Receita, por temer a prescrição do crime. A pedido dele, o STF deverá enviar ofício ao 1o Conselho de Contribuintes informando quando a ação chegar ao fim. A Folha não localizou o deputado para comentar o assunto.
Jader é alvo de vários inquéritos no STF. Um deles apura suspeita de desvio de US$ 913,315 mil do Banpará (Banco do Estado do Pará) quando era governador, entre 1984 e 1997. Em 2001, ele renunciou ao mandato de senador para escapar de processo de cassação. Em 2002, ele se elegeu deputado.

FSP, 13/05/2005, Brasil, p. A7

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