FSP, Dinheiro, p. B4
05 de Out de 2009
Eletrobrás quer uma Belo Monte no exterior
Estatal busca se converter em Petrobras do setor elétrico e negocia 9.500 MW em novas usinas pela América do Sul
Objetivo é internacionalizar a Eletrobrás e trazer para o país energia hidrelétrica de usinas construídas em outros países da região
Agnaldo Brito
Da reportagem local
A Eletrobrás, estatal com planos de ser a Petrobras do setor elétrico, negocia a construção de grandes hidrelétricas na América do Sul e na América Central. O ousado plano da estatal prevê a construção de usinas com capacidade instalada total de até 9.500 MW, quase 10% da base ativa hoje no Brasil. Os oito projetos planejados pela Eletrobrás quase equivalem ao gigante e polêmico empreendimento de Belo Monte, no rio Xingu (Pará), que está em fase de licenciamento.
Há dois objetivos para esse movimento da estatal brasileira. O primeiro é dar impulso ao seu plano de crescimento, com operações internacionais -o que inclui a busca de negócios na área de transmissão de energia inclusive nos Estados Unidos. O segundo é garantir, com esse movimento, a integração regional da infraestrutura do setor elétrico na América do Sul. A produção de energia em países onde o potencial hidrelétrico ainda não foi usado pode assegurar a expansão da oferta que será necessária ao Brasil.
Por ano, o país precisa expandir de 3.000 MW a 5.000 MW a base instalada, a depender do PIB. Nos últimos anos, sem as hidrelétricas, esse aumento de oferta só foi possível com usinas térmicas a gás natural, mais caras e poluentes. A produção de energia hidrelétrica próxima à fronteira brasileira pode, portanto, atender a essa demanda, avalia a Eletrobrás. Isso porque a energia excedente produzida na Guiana, no Peru e na Argentina será transportada por linhas de transmissão para o Brasil.
O projeto mais adiantado é o da usina de Inambari, no departamento de Madre de Dios, no Peru. O projeto prevê a construção de uma usina de 2.000 MW e de uma linha de transmissão com 1.600 quilômetros -que ligará a unidade a Porto Velho (RO). Dessa forma, a energia produzida lá seria, em parte, transferida para o sistema interligado brasileiro. A obra, de US$ 4 bilhões, poderá já estar no leilão de energia para o mercado regulado no Brasil em 2010, com perspectiva de oferta efetiva em 2015.
Além desse, a Eletrobrás, em parceria com a Odebrecht, a Engevix, a Andrade Gutierrez e a OAS, estuda quatro aproveitamentos hidrelétricos em solo peruano. Somados, totalizam mais 4.500 MW.
O projeto de Inambari chamou a atenção da imprensa do país andino, que acusa o governo do presidente Alan García de aceitar um projeto que beneficia o Brasil, enquanto os danos ambientais entrarão na conta da Amazônia peruana. É a mesma crítica apontada por muitos opositores do projeto da usina de Belo Monte e dos empreendimentos planejados pelo Brasil em outras áreas da região amazônica.
Binacional
Como Itaipu, há um novo plano para a construção de uma usina binacional. Desta vez, no rio Uruguai. O projeto Garabi, estudado pela CNEC (do Grupo Camargo Corrêa), é parceria entre os governos brasileiro e argentino. A usina planejada terá 2.000 MW de capacidade instalada e linhas de transmissão com capacidade equivalente que levarão essa energia para o Brasil e para a Argentina. Até abril de 2010, os estudos que atentam a viabilidade estarão prontos. A modelagem do projeto ainda não está definida.
Na Guiana, a Eletrobrás estuda a construção de uma usina de 800 MW, no rio Mazaruni. Sinval Gama, superintendente de operações internacionais, diz que o projeto abastecerá a Guiana com 100 MW e transferirá para Boa Vista (única capital brasileira fora do sistema interligado) outros 700 MW. Com a importação de energia da Guiana, Boa Vista pode reduzir o uso de térmicas.
A construção de usinas pela Eletrobras fora do Brasil tem ainda projeto na Nicarágua. A hidrelétrica de 220 MW fica no rio Grande de Matagalpa. Segundo Gama, a obra está estimada em US$ 600 milhões. Nesse caso, a energia abasteceria a América Central, onde já existe um sistema interligado e operado por uma empresa.
Interligação pode reduzir valor da conta de luz
Da reportagem local
Os consumidores sul-americanos de energia elétrica poderiam ter uma economia de US$ 1 bilhão em suas contas de luz se todos os projetos de interconexão entre os países da região estivessem prontos. O cálculo foi elaborado pela Cier (Comissão de Integração Energética Regional), instituição multinacional formada por 230 empresas do setor de energia com operações nos dez países sul-americanos.
A razão para esse ganho é simples. A interligação dos sistemas elétricos de vários países permitiria maior aproveitamento dos reservatórios das hidrelétricas do continente, com a possibilidade de transferir energia de uma região com grande volume de água nos reservatórios para outra com baixo volume armazenado.
Dessa forma, no período em que uma região recuperasse o nível dos reservatórios, receberia eletricidade de onde houvesse energia em abundância. Isso reduziria o volume de água liberado nas barragens sem geração de energia.
O trabalho também avaliou que a conclusão de todas as linhas de transmissão entre os países sul-americanos evitaria a necessidade de investimentos de R$ 9,6 bilhões em novas usinas, devido à possibilidade de transferência de energia. Esse mesmo sistema já opera hoje no Brasil. É por isso que o país quer construir linhas de transmissão para se ligar ao Peru e reforçar conexões com Uruguai, Argentina e Venezuela.
Esses dados serão apresentados na Interconexões 2009, encontro patrocinado pela Cier, no Rio de Janeiro. O evento acontecerá entre os dias 14 e 16 deste mês. Um diagnóstico sobre todos os projetos de conexão em andamento no continente sul-americano será apresentado no evento.
A região tem hoje 13 pequenas linhas de conexão entre países do continente, das quais 11 estão em operação, e 2, em projeto. Existem ainda outras 23 linhas de transmissão de alta tensão no subcontinente, das quais 19 operam. Há quatro projetos em estudo. (AB)
FSP, 05/10/2009, Dinheiro, p. B4
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